Bruxismo do Sono e Bruxismo em Vigília: O novo consenso.

O Bruxismo é uma condição frequente na população e de grande interesse para pesquisadores e clínicos da área da Odontologia. O seu conceito, etiologia, fisiopatologia e controle está em constante atualização para um melhor entendimento. Em março de 2018, foi publicado no Journal of Oral Rehabilitation, o Consenso Internacional em Bruxismo. Em primeiro lugar recomenda-se que a definição única seja “aposentada” em favor de 2 definições separadas, baseadas no ciclo circadiano:

Bruxismo do Sono (BS)

Atividade muscular mastigatória involuntária rítmica, não-rítmica ou mista, não funcional, durante o sono. Caracterizado por ranger, apertar, encostar os dentes ou segurar, tensionar a mandíbula na mesma posição. Não é considerado um distúrbio do movimento ou um distúrbio do sono em indivíduos saudáveis.

Bruxismo em Vigília (BV)

Atividade muscular mastigatória semi-voluntária (possível de ser modificada), não funcional, enquanto o paciente está acordado. Caracterizado pelo contato repetitivo ou sustentado dos dentes em apertar, encostar ou segurar, tensionar a mandíbula na mesma posição. Também não pode ser considerado um distúrbio do movimento em indivíduos saudáveis.

Ambos os tipos de Bruxismo são regulados principalmente pelo Sistema Nervoso Central, não pelo Sistema Nervoso Periférico, ou seja, não é causado por fatores anatômicos como características da oclusão e articulação temporomandibular. Além disso, pode ocorrer sem a presença necessária de contato dentário, sendo somente por tensão dos músculos mastigatórios. 

A etiologia é multifatorial e envolve aspectos genéticos e ambientais. Os aspectos genéticos são conhecidos como fatores primários. Já os ambientais, como secundários, e estão relacionados à condições sistêmicas do organismo. No BS as condições associadas mais comuns são: obstrução das vias aéreas, apneia obstrutiva do sono, refluxo gastroesofágico e efeito colateral de algumas medicações como os antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina e norepinefrina. O BV parece estar associado aos fatores psicossociais, muito mais que o BS, como: nervosismo, estresse, ansiedade e atividades que exijam concentração.

O Bruxismo não é considerado uma DTM (Disfunção Tempomandibular), porém atividades musculares excessivas podem levar a uma sobrecarga na articulação temporomandibular, impactando negativamente o sistema estomatognático. O Bruxismo causa dor passageira, se a dor persiste, pode ser DTM. Ademais, o BV é um fator de risco significativo para a ocorrência de DTM, pois ele é 6 vezes mais frequente que o BS nesses casos.

O BS está associado a um evento que acontece na microestrutura do sono, onde o paciente tem um microdespertar, seguido de taquicardia, contração da musculatura e ranger de dentes. Geralmente o paciente faz em torno de 15 minutos de BS em 8 horas de sono, pouco tempo comparado ao BV durante o dia.

A detecção dos tipos de Bruxismo deve adotar o sistema de classificação de possível, provável e definitivo. São realizados através de questionários, exame clínico, métodos ecológicos (aplicativos), eletromiografia e polissonografia. No caso do BS, o passo mais importante para o diagnóstico é o relato das pessoas que dormem com o paciente. Já no BV, é necessário o relato do próprio paciente que fica com os dentes encostados, apertados ou a musculatura da mastigação tensionada. 

O Bruxismo pode ser considerado fator de risco para desgaste dental, fratura de dentes ou restaurações, hipertrofia da musculatura mastigatória, mobilidade dentária, desconforto, cansaço ou dor muscular, travamento fechado ao acordar, língua, bochechas ou mucosa marcada. Os sinais clínicos mais comuns do BS são a presença de desgaste dentário, fratura de restaurações e dentes. O desgaste dental, como único achado, não significa que o Bruxismo está ativo, pois pode ser uma cicatriz de episódios anteriores. No caso do BV, os pacientes apresentam principalmente a língua, bochechas ou mucosa marcadas.

Estudos epidemiológicos revelam que o BS é mais comum em crianças do que em adultos, tende a diminuir com a idade, além de não ter preferência por sexo. Já o BV tem sua frequência maior em adultos do que em crianças e maior incidência em mulheres.

O Bruxismo não tem cura, somente controle. As abordagens devem ser  reversíveis e o uso da Toxina botulínica apenas reduz a força mastigatória do paciente, ou seja, não cessa o bruxismo. Se o paciente apresentar bruxismo primário (genético) pode durar a vida toda, caso ele seja secundário, o controle deve inicialmente ser focado, de forma multidisciplinar, nos possíveis fatores associados. O BS pode ser entendido como um sinalizador de outra condição de saúde. 

Para o BS recomenda-se uma abordagem nomeada de “Múltiplo P” que contempla: Placa oclusal durante o sono, Papo com o paciente (orientações quanto a higiene do sono), Psicologia e Pílulas (medicação para dor e relaxamento muscular). A placa oclusal não reduz os eventos de bruxismo, mas tem um efeito transitório de diminuição dos episódios e protege os dentes e periodonto. A mesma deve ser rígida, lisa, confortável, espessura em torno de 2 mm, com contatos bilaterais e simultâneos.

No controle do BV deve-se conscientizar o paciente de seu hábito para que ele tente mudar o seu padrão. Pode-se utilizar recursos visuais (post-it, adesivos) ou aplicativo no celular para lembrar o paciente de desencostar os dentes (Aplicativo: Desencoste seus dentes). Os aspectos psicossociais devem ser investigados. Indica-se a prática da Ioga e meditação, exercícios físicos, terapias físicas e psicológica, de acordo com cada caso. 

Referências Bibliográficas:

GOLDSTEIN, R.E. et al. The Clinical Management of Awake Bruxism. The Journal of the American Dental Association. v. 148, n. 6, p. 387-391, 2017.

LAVIGNE, G.J. et al. Bruxism physiology and pathology: an overview for clinicians. Journal of Oral Rehabilitation, v. 35, n. 7, p. 476-494, 2008.  

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LOBBEZOO, F. et al. International consensus on the assessment of bruxism: report of a work in progress. Journal of Oral Rehabilitation, v. 45, n. 11, p. 837-844, 2018.

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